quinta-feira, 28 de abril de 2011

Tiro certeiro.

     Foi um tiro, foi uma bala. O soluço dela se estendeu pela madrugada feito um vento em dia de maremoto, terremoto ou de um tornado qualquer, pelo simples fato da fala dele se estender em alto e péssimo tom de briga, de dor, de insulto. Foi o famoso do baque que deu nela, no momento. Era uma discussão de quase 9 meses e abortada, que não saiu do ventre e se foi, mesmo assim, sem tempo de respirações no mundo terreno. Era madrugada, mais uma madrugada perdida, em cima de lençóis e seu travesseiro de guerra, e era ainda madrugada de ventania, sem abraço, sem colo, sem cobertor e nada. Esperança já não mais havia. Ela, como tantas e todas as mulheres, via a discussão como resolução, se falada calmamente, em tom sereno, baixo e retraído. Para ele, como para quase todos os homens, era pura bobagem, perda de tempo, de mente e de momento. Mas, que nada... Se ela insistia tanto, havia um motivo e o sabia, mas, compreensão é o que lhe faltava. Aquele "é? mas, vamos tentar mudar, vamos ficar bem" não aparecia, e só aparecia um tom alheio de raiva, de negação, de repreensão.
     Ela, então, em uma de suas piores e mais frias madrugadas, leu as mais compreensivas e doces palavras a que eram mencionadas pelo seu poeta favorito, sensível, romântico, compreensivo: "Quando sua mulher provoca, não deixe de discutir. Vá que a raiva dela se apaixone por outro homem". Seu desejo que ele o visse era tanto! Mas, não, não havia nada que o faria mudar, afinal, o mesmo já sabia melhor que ninguém que a discussão de voz fina não se calaria nunca, não deixaria de lado a discussão. E, mesmo que tudo fosse um bom motivo, ela estava ali, não ia embora, enquanto ele não discutia, a deixava ir e ia, sem nem sequer haver importância ou qualquer peso em sua sã consciência insensata. "Discussão é coisa de quem quer briga e não quero", ele dizia, mas, nada se resolvia, nada se falava e nada se fazia. As plantas eram esquecidas, não eram mais tão bem regadas quanto antes. Ele esquecia.
     E mesmo que ele não quisesse, ela insistia, insistia e discutia porque era, sim, a discussão que a fazia não desistir de nada. Mas, era um erro...estava errado discutir e só, segundo ele. E quem dirá que sua raiva se apaixone por outra discussão, se sua discussão é toda ele? Por ela, não, e ele insistia em não discutir, em deixá-la ir, mandá-la ir e ir embora.